
Friday, February 03, 2006
Friday, December 30, 2005
Um mundo melhor #2
Num mundo melhor, as crianças todas terão acesso a comida, água potável, serviços de saúde e higiene.
Num mundo melhor não teremos metade das pessoas a desperdiçar comida enquanto outra metade morre de fome e malnutrição. Metade das crianças de África são malnutridas e 6 milhões morrem todos os anos.
As crianças malnutridas que sobrevivem tornam-se muito mais vulneráveis a doenças e menos capazes intelectualmente. Enquanto isso, nos países desenvolvidos, milhões de toneladas de comida são deitadas no lixo.
Num mundo melhor não teremos presidentes corruptos que deixam o seu povo morrer à fome enquanto compram mais um carro de luxo com dinheiro que não lhes pertence.
Quem o permite? Por que parece passar despercebido aos olhos de todos, quando sabemos que todos o sabem? É como se todos o permitíssemos…
Por que não contribuem mais os países ricos? E por que é que são precisamente os ricos, aqueles que mais mesquinhamente contribuem?
São coisas que dão que pensar…
Num mundo melhor não teremos metade das pessoas a desperdiçar comida enquanto outra metade morre de fome e malnutrição. Metade das crianças de África são malnutridas e 6 milhões morrem todos os anos.
As crianças malnutridas que sobrevivem tornam-se muito mais vulneráveis a doenças e menos capazes intelectualmente. Enquanto isso, nos países desenvolvidos, milhões de toneladas de comida são deitadas no lixo.
Num mundo melhor não teremos presidentes corruptos que deixam o seu povo morrer à fome enquanto compram mais um carro de luxo com dinheiro que não lhes pertence.
Quem o permite? Por que parece passar despercebido aos olhos de todos, quando sabemos que todos o sabem? É como se todos o permitíssemos…
Por que não contribuem mais os países ricos? E por que é que são precisamente os ricos, aqueles que mais mesquinhamente contribuem?
São coisas que dão que pensar…
Thursday, December 01, 2005
Sem palavras...
eu sinto...
Fecho os olhos.
Mesmo assim eu sinto...
O meu corpo estremeceu.
Não consigo adormecer.
Nem o tempo vai chegar
Para dizer o quanto eu sinto
Você longe de mim.
É uma espécie de dor..."
Saturday, November 26, 2005
Um mundo melhor #1
Num mundo melhor, as mulheres poderão abortar sem coacção psicológica por parte de maridos mal formados, padres e todos os moralistas da sociedade.
Num mundo melhor os direitos à vida, à integridade física, à autodeterminação e à liberdade serão de todas as mulheres.
Segundo a OMS, 200.000 mulheres por ano morrem devido a abortos ilegais ou partos involuntários quando não encontram onde o fazer (ou quando não as deixam procurar onde o fazer). Um parto voluntário também tem riscos, mas não se viola o direito à vida da mulher.
Num mundo melhor não se viola o direito à autodeterminação, liberdade e integridade física ao forçar-se uma mulher a dar à luz um filho que não quer. Viver 9 meses de uma gravidez indesejada deve ser verdadeiramente angustiante. Isto sem falar do que viverá depois do nascimento: infelicidade ou adopção, ou seja, infelicidade ou infelicidade. É fantástico que a lei obrigue as mulheres a sacrificar os seus direitos em prol da potencial vida de outrém.
Num mundo melhor os direitos à vida, à integridade física, à autodeterminação e à liberdade serão de todas as mulheres.
Segundo a OMS, 200.000 mulheres por ano morrem devido a abortos ilegais ou partos involuntários quando não encontram onde o fazer (ou quando não as deixam procurar onde o fazer). Um parto voluntário também tem riscos, mas não se viola o direito à vida da mulher.
Num mundo melhor não se viola o direito à autodeterminação, liberdade e integridade física ao forçar-se uma mulher a dar à luz um filho que não quer. Viver 9 meses de uma gravidez indesejada deve ser verdadeiramente angustiante. Isto sem falar do que viverá depois do nascimento: infelicidade ou adopção, ou seja, infelicidade ou infelicidade. É fantástico que a lei obrigue as mulheres a sacrificar os seus direitos em prol da potencial vida de outrém.
Sunday, November 20, 2005
Stem Cells - Desperdícios da Ética

Quando um óvulo é fecundado, transformando-se num ovo, este divide-se em duas células. As duas células dividem-se em quatro e por aí fora. Há muitos anos que os cientistas sonham colher essas jovens células embrionárias para tentarem reproduzir o milagre da sua transformação/diferenciação nas centenas de tipos de células existentes no nosso corpo.
Devido a essa sua faculdade, estas células poderão ser a solução para fazer a reparação de órgãos e tecidos lesados. Doenças cardíacas podiam deixar de ser um problema através da indução da diferenciação de células estaminais em células do músculo cardíaco, algo que já foi testado com sucesso em laboratório.
Deveria ter sido o ínicio de uma importante revolução na medicina quando o cientista James Thomson anunciou em Novembro de 1998 ter colhido com êxito células de embriões excedentários disponíveis em clínicas de fertilidade e criado a primeira linha de células estaminais embrionárias humanas. No entanto aconteceu o contrário, gerando-se uma grande polémica e controvérsia em redor deste assunto e impedindo que a técnica fosse desenvolvida e aplicada.
Os embriões são ainda considerados por muitos como seres com sentimentos e direitos e, como tal, colher células a partir de embriões é semelhante a fazer um aborto. Mas a realidade é que os embriões humanos apenas adquirem o sistema nervoso à 12ª semana de gestação e neste tipo de investigações eles são usados muitíssimo antes - com apenas 10 dias!
Os apoiantes destas ideias defendem que em vez de células estaminais embrionárias jovens, podem ser usadas células estaminais adultas da medula óssea ou do cordão umbilical. O problema é que estas células estaminais adultas são raríssimas (uma em cada milhão de células da medula) e não demonstraram ainda ser eficazes a diferenciar-se em todo o tipo de células produzidas pelas células embrionárias jovens. Além disso, nas clínicas de fertilização há milhões de embriões a serem destruídos constantemente que poderiam ser utilizados para investigação, com consentimento dos dadores. Se estas células têm "sentimentos" para ser estudadas, não têm sentimentos para ser destruídas? Se usar embriões humanos para tentar curar doenças é assassínio em massa, destruí-los sem tentar salvar alguém, é o quê?
Países como o Reino Unido, China e Coreia do Sul são dos poucos que possuem centros de investigaçao destas células que têm conseguido apresentar alguns progressos, apesar dos limites a que são sujeitos.
É uma pena que mais uma vez uma descoberta que podia evitar tantas mortes, não possa avançar por estar presa numa teia política e religiosa. Não se podem usar embriões para fazer investigações que salvarão vidas porque não é "éticamente correcto", mas já é correcto que eles sejam deitados ao lixo sem tentar encontrar uma solução para doenças de que tantos milhares de pessoas sofrem e, pelas quais, morrem todos os dias.
Fala-se TANTO em ética... Mas falta de ética é desperdiçar tantos embriões e com eles tantas outras vidas.
Sunday, November 13, 2005
Thursday, August 11, 2005
Sagradas Escrituras
No princípio, Deus criou o Céu e a Terra. A Terra era informe e vazia e as trevas cobriam a face dos abismos. Não era um sucesso… Deus viu isso e desejou que aquilo nunca tivesse existido, mas isso Ele já não podia fazer por isso o melhor era aceitar o Seu trabalho.
“1. Deus disse: «faça-se luz», e a luz fez-se.
2. Deus viu que a luz era boa e Ele rejubilou-se no Seu coração.
3. Era uma sorte. Ela poderia igualmente ter sido má. Vocês sabem como é, quando se cria qualquer coisa, às vezes sai bem, às vezes sai mal. (…)
4. Deus disse para consigo que, se ele tivesse sabido, teria começado por criar a luz.
5. O que prova que Ele tinha muito que aprender.
6. Ora, Deus, sendo omnisciente, não pode aprender nada que não saiba já.
7. A não ser que, naturalmente, ele tenha decidido no Seu todo-poder não saber esta ou aquela coisa, quer dizer, não ser mais omnisciente.
8. Quer dizer, não ser mais Deus.
9. Porque Deus pode tudo, mesmo deixar de ser Deus. Mesmo suprimir-Se a si próprio.
10. O que é um pouco embaraçoso, porque então Deus não é eterno.
11. Porque se Ele é eterno não pode morrer, mesmo que assim o decida e, então, ele não é todo-poderoso.
12. Deus tem portanto a escolha ou é Eterno ou é Todo-Poderoso.
13. E em ambos os casos: não é Deus.
14. Este é um problema insolúvel.
15. Um problema insolúvel é um problema que não tem solução. Se ele não tem solução ninguém o pode resolver, nem mesmo Deus.
16. Por conseguinte, um problema insolúvel é mais forte que Deus.
17. Mas os problemas insolúveis, como todas as coisas, foram criados por Deus. (Contudo Ele não se lembrava de ter criado essa…) A criatura não pode estar acima do seu Criador.
18. Tudo isto faz pensar.
19. Foi precisamente à força de tanto pensar em tais coisas desde a eternidade da duração que Deus, para mudar as suas próprias ideias, decidiu criar.
20. Mas quanto mais Ele criava mais isso Lhe dava que pensar.
21. Hum…
22. Então, Deus interrogou-se se seria mesmo Deus.
23. Mas se Deus não é Deus, quem é que é Deus?
24. Ham? Ham?
25. Não saio deste ponto.
26. Deus viu que qualquer coisa não ia bem.
27. Felizmente Deus viu que tinha criado a Contradição, e voltou a serenar o Seu coração.
28. Porque, graças à Contradição, Ele podia então ser e não ser ao mesmo tempo (…).
29. Portanto, Ele não tinha nenhuma razão para Se preocupar.
30. Bastava-lhe não pensar mais no assunto.
31. E deixar mesmo de pensar.
32. Porque o pensamento não é bom.
33. Quando começamos a pensar nunca sabemos onde é que vamos parar. Quando Deus começa a pensar o Seu pensamento arrisca-se a dar com isto, o que é muito desagradável: que Ele não existe.
34. Ora, Deus quer existir.
35. Ponham-se no seu lugar.
36. Se Deus tivesse de deixar de existir cada vez que a Sua existência se torna logicamente absurda, não haveria religião possível.
37. E, neste vale de lágrimas, as criaturas não saberiam o que haviam de fazer domingo de manhã antes da hora do aperitivo.
38. E isso seria triste.
39. Felizmente Deus não pensa.
40. Graças a Deus!”
“As Sagradas Escrituras” de Cavanna.
“1. Deus disse: «faça-se luz», e a luz fez-se.
2. Deus viu que a luz era boa e Ele rejubilou-se no Seu coração.
3. Era uma sorte. Ela poderia igualmente ter sido má. Vocês sabem como é, quando se cria qualquer coisa, às vezes sai bem, às vezes sai mal. (…)
4. Deus disse para consigo que, se ele tivesse sabido, teria começado por criar a luz.
5. O que prova que Ele tinha muito que aprender.
6. Ora, Deus, sendo omnisciente, não pode aprender nada que não saiba já.
7. A não ser que, naturalmente, ele tenha decidido no Seu todo-poder não saber esta ou aquela coisa, quer dizer, não ser mais omnisciente.
8. Quer dizer, não ser mais Deus.
9. Porque Deus pode tudo, mesmo deixar de ser Deus. Mesmo suprimir-Se a si próprio.
10. O que é um pouco embaraçoso, porque então Deus não é eterno.
11. Porque se Ele é eterno não pode morrer, mesmo que assim o decida e, então, ele não é todo-poderoso.
12. Deus tem portanto a escolha ou é Eterno ou é Todo-Poderoso.
13. E em ambos os casos: não é Deus.
14. Este é um problema insolúvel.
15. Um problema insolúvel é um problema que não tem solução. Se ele não tem solução ninguém o pode resolver, nem mesmo Deus.
16. Por conseguinte, um problema insolúvel é mais forte que Deus.
17. Mas os problemas insolúveis, como todas as coisas, foram criados por Deus. (Contudo Ele não se lembrava de ter criado essa…) A criatura não pode estar acima do seu Criador.
18. Tudo isto faz pensar.
19. Foi precisamente à força de tanto pensar em tais coisas desde a eternidade da duração que Deus, para mudar as suas próprias ideias, decidiu criar.
20. Mas quanto mais Ele criava mais isso Lhe dava que pensar.
21. Hum…
22. Então, Deus interrogou-se se seria mesmo Deus.
23. Mas se Deus não é Deus, quem é que é Deus?
24. Ham? Ham?
25. Não saio deste ponto.
26. Deus viu que qualquer coisa não ia bem.
27. Felizmente Deus viu que tinha criado a Contradição, e voltou a serenar o Seu coração.
28. Porque, graças à Contradição, Ele podia então ser e não ser ao mesmo tempo (…).
29. Portanto, Ele não tinha nenhuma razão para Se preocupar.
30. Bastava-lhe não pensar mais no assunto.
31. E deixar mesmo de pensar.
32. Porque o pensamento não é bom.
33. Quando começamos a pensar nunca sabemos onde é que vamos parar. Quando Deus começa a pensar o Seu pensamento arrisca-se a dar com isto, o que é muito desagradável: que Ele não existe.
34. Ora, Deus quer existir.
35. Ponham-se no seu lugar.
36. Se Deus tivesse de deixar de existir cada vez que a Sua existência se torna logicamente absurda, não haveria religião possível.
37. E, neste vale de lágrimas, as criaturas não saberiam o que haviam de fazer domingo de manhã antes da hora do aperitivo.
38. E isso seria triste.
39. Felizmente Deus não pensa.
40. Graças a Deus!”
“As Sagradas Escrituras” de Cavanna.
Tuesday, August 02, 2005
Canção
Foto de Filipe Serralheiro.
Hoje venho dizer-te que nevou
no rosto familiar que te esperava.
Não é nada, meu amor, foi um pássaro,
a casca do tempo que caiu,
uma lágrima, um barco, uma palavra.
Foi apenas mais um dia que passou
entre arcos e arcos de solidão;
a curva dos teus olhos que se fechou,
uma gota de ouvalho, uma só gota,
secretamente morta na tua mão.
Eugénio de Andrade, 1972
no rosto familiar que te esperava.
Não é nada, meu amor, foi um pássaro,
a casca do tempo que caiu,
uma lágrima, um barco, uma palavra.
Foi apenas mais um dia que passou
entre arcos e arcos de solidão;
a curva dos teus olhos que se fechou,
uma gota de ouvalho, uma só gota,
secretamente morta na tua mão.
Eugénio de Andrade, 1972
Monday, July 25, 2005
Cansaço
O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...
- Álvaro de Campos
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...
- Álvaro de Campos
Sunday, May 01, 2005
Mães
Elas são as mães:
rompem do inferno,
furam a treva,
arrastando
os seus mantos na poeira das estrelas.
Animais sonâmbulos,
dormem nos rios, na raiz do pão.
Na vulva sombria
é onde fazem o lume:
ali têm casa.
Em segredo, escondem
o latir lancinante dos seus cães.
Nos olhos, o relâmpago
negro do frio.
Longamente bebem
o silencio
nas próprias mãos.
O olhar
desafia as aves:
o seu voo é mais fundo.
Sobre si se debruçam
a escutar
os passos do crepúsculo.
Despem-se ao espelho
para entrarem
nas águas da sombra.
É quando dançam que todos os caminhos
levam ao mar.
São elas que fabricam o mel,
o aroma do luar,
o branco da rosa.
Quando o galo canta
Desprendem-se
para serem orvalho.
- Eugénio de Andrade
rompem do inferno,
furam a treva,
arrastando
os seus mantos na poeira das estrelas.
Animais sonâmbulos,
dormem nos rios, na raiz do pão.
Na vulva sombria
é onde fazem o lume:
ali têm casa.
Em segredo, escondem
o latir lancinante dos seus cães.
Nos olhos, o relâmpago
negro do frio.
Longamente bebem
o silencio
nas próprias mãos.
O olhar
desafia as aves:
o seu voo é mais fundo.
Sobre si se debruçam
a escutar
os passos do crepúsculo.
Despem-se ao espelho
para entrarem
nas águas da sombra.
É quando dançam que todos os caminhos
levam ao mar.
São elas que fabricam o mel,
o aroma do luar,
o branco da rosa.
Quando o galo canta
Desprendem-se
para serem orvalho.
- Eugénio de Andrade
Tuesday, March 29, 2005
Sunday, March 13, 2005
Escuridão
Há semanas que várias questões não me saem da cabeça.
Como será viver na escuridão? Como será não ver o sol, nem a lua nem as estrelas? Como será ser cego? Até se pode sentir o calor do sol... Mas não se sente um luar... E como se sente um sorriso?
Como será viver na escuridão? Como será não ver o sol, nem a lua nem as estrelas? Como será ser cego? Até se pode sentir o calor do sol... Mas não se sente um luar... E como se sente um sorriso?
Sunday, February 20, 2005
Espelho
Que livro levaria para uma ilha deserta?, perguntam-me. E eu: qualquer um que tivesse uma capa espelhada. Tento imaginar um mundo sem espelhos. Consigo, claro, mas acho-o um tormento. Narcisismo? Creio que não. Chama-se narcisismo ao amor pela própria imagem. O que acontece comigo é um pouco diferente. Procuro num espelho e confirmação da minha existência. "Vejo-me, logo existo".
Não há amigo mais sincero (e mais cruel também) do que um espelho. Os espelhos nunca mentem. São firmes, objectivos, e tão desprovidos de imaginação e sentido de humor quanto um burocrata alemão.
O espelho da Rainha Má, a madrasta da Branca de Neve, podia ter continuado a repetir, a cada manhã, "não há neste reino mulher mais bela do que tu". Evitaria a cólera da Rainha e, além disso, pouparia uma série de dissabores à Branca de Neve. Podia ter-se especializado na arte do sofisma, como fazem os advogados, ou os conselheiros dos poderosos da terra: "não há neste reino outra mulher ao mesmo tempo tão bela e tão rica quanto tu", ou: "não há neste reino outra mulher, pelo menos na tua faixa etária, tão bela quanto tu". O desgraçado, porém, não sabia nem mentir nem sofismar. Se bem me lembro a Rainha não lhe perdoou a franqueza e quebrou-o num acesso de cólera. Muitos espelhos acabam assim.
Olhar-se ao espelho todos os dias, depois de acordar, olhar para si atentamente, profundamente, não é um exercício de vaidade e sim de humildade. Desconfio de quem não use espelhos. Todos os espelhos nos dizem o mesmo - ou nos dizem "ainda és bela"; ou nos dizem: "já não és mais bela".
Um espelho dá-nos a ver como tudo passa, como tudo é efémero, ao mesmo tempo que mostra as nossas imperfeições e nos ajuda a corrigilas. Na minha opinião é mais fácil alcançar a santidade, ou, ao menos, uma certa tranquilidade espiritual, feita de compaixão e do reconhecimento das nossas limitações, através de um espelho.
Sonho às vezes que me olho ao espelho e não encontro o meu rosto. Numa variante ainda mais assustadora deste pesadelo olho-me ao espelho e encontro, sorrindo para mim, um rosto que não é o meu.
Michael Jackson vive dentro de um pesadelo como este e talvez se tenha escondido atrás de uma máscara por não ser capaz de enfrentar um espelho. Ou talvez nunca tenha escutado o seu espelho.
Eu tenho escutar o meu.
F. Hayat
Não há amigo mais sincero (e mais cruel também) do que um espelho. Os espelhos nunca mentem. São firmes, objectivos, e tão desprovidos de imaginação e sentido de humor quanto um burocrata alemão.
O espelho da Rainha Má, a madrasta da Branca de Neve, podia ter continuado a repetir, a cada manhã, "não há neste reino mulher mais bela do que tu". Evitaria a cólera da Rainha e, além disso, pouparia uma série de dissabores à Branca de Neve. Podia ter-se especializado na arte do sofisma, como fazem os advogados, ou os conselheiros dos poderosos da terra: "não há neste reino outra mulher ao mesmo tempo tão bela e tão rica quanto tu", ou: "não há neste reino outra mulher, pelo menos na tua faixa etária, tão bela quanto tu". O desgraçado, porém, não sabia nem mentir nem sofismar. Se bem me lembro a Rainha não lhe perdoou a franqueza e quebrou-o num acesso de cólera. Muitos espelhos acabam assim.
Olhar-se ao espelho todos os dias, depois de acordar, olhar para si atentamente, profundamente, não é um exercício de vaidade e sim de humildade. Desconfio de quem não use espelhos. Todos os espelhos nos dizem o mesmo - ou nos dizem "ainda és bela"; ou nos dizem: "já não és mais bela".
Um espelho dá-nos a ver como tudo passa, como tudo é efémero, ao mesmo tempo que mostra as nossas imperfeições e nos ajuda a corrigilas. Na minha opinião é mais fácil alcançar a santidade, ou, ao menos, uma certa tranquilidade espiritual, feita de compaixão e do reconhecimento das nossas limitações, através de um espelho.
Sonho às vezes que me olho ao espelho e não encontro o meu rosto. Numa variante ainda mais assustadora deste pesadelo olho-me ao espelho e encontro, sorrindo para mim, um rosto que não é o meu.
Michael Jackson vive dentro de um pesadelo como este e talvez se tenha escondido atrás de uma máscara por não ser capaz de enfrentar um espelho. Ou talvez nunca tenha escutado o seu espelho.
Eu tenho escutar o meu.
F. Hayat
Subscribe to:
Posts (Atom)